segunda-feira, abril 03, 2006

A flauta de Pã

No centro do universo, há uma nebulosa
oculta que, como um espelho inverso,
atrai e absorve toda a luz. Alguns dizem
que é aí a fonte da inocência, o país misterioso
dos anjos, com colinas e rios luminosamente
azuis. Alguns falam de naves transviadas,
e sentam-se nas margens a ouvir histórias
de astronautas voadores. Ninguém viu,
ninguém sabe – mas pode pressupor-se
que a matéria, no dia inaugural, sendo
excessiva, guardou num cofre os moldes
primitivos numa muito humana precaução
estelar. Assim, os mais ousados especulam
que essa tal nebulosa inversa é, na verdade,
a mais perfeita matriz de um futuro antigo
que, num jogo de espelhos, o passado
fabrica de contínuo e sem parar (e as fontes, rios,
anjos, e os astronautas em naves orbitrais). Talvez.
Mas há quem diga que no centro do universo,
em certos dias, o silêncio dos astros ressoa
estranhamente – e que a matéria inversa cristaliza
ao som ligeiro e breve da flauta de um pastor.